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Os oito valores que os nikkeis brasileiros querem transmitir aos seus descendentes

São Paulo, a maior metrópole do Brasil(Pixabay)

Sinto a forte consciência da “Responsabilidade de transmitir a longo prazo o legado nikkei”

O novo coronavírus está espalhado pelo mundo todo e os governantes dos países tomam medidas diversas, obtendo reações que diferem de acordo com o perfil da população.

O Japão adotou protocolos amenos se comparados aos países ocidentais, mesmo assim, o número de contágios e mortes foi baixo. A razão disso tem sido pesquisada e provocado comentários. O vice-primeiro ministro Aso mencionou a “diferença no nível das pessoas”, enquanto o ganhador do prêmio Nobel Professor Yamanaka também busca a solução do “Fator X”.

Mesmo insatisfeitos com as medidas contra o coronavírus, que por vezes favorecem os interesses econômicos, os japoneses não se queixam de ter que usar máscaras. No Ocidente, as pessoas se revoltam dizendo que a obrigatoriedade da máscara é um atentado à liberdade e nós não compreendemos isso. Dependendo do país, as reuniões religiosas estão proibidas para evitar concentração e as pessoas questionam se isto é realmente necessário. A expectativa é de que em breve as vacinas começarão a ser aplicadas e provavelmente muitos a recusarão (no Japão também isso pode acontecer). Existe a possibilidade de haver controvérsias sobre os países poderem ou não obrigar a população a ser vacinada.

Penso que com o surgimento do novo coronavírus, diferenças culturais que notávamos quando viajávamos a lazer ou negócios, ficaram ainda mais evidentes.

No processo de crescimento pessoal, a autoconsciência é estabelecida observando-se a diferença de valores com os que nos rodeiam. Já quando fazemos parte de um grupo, a tomada de consciência sobre a diferença de valores com pessoas de fora, fortalece a identidade do grupo. Neste momento, os nikkeis brasileiros que vivem no Brasil devem ter percebido isso.

E na sequência apresento este conteúdo.

Temos a responsabilidade de transmitir o legado nikkei a longo prazo

Em 6 de junho de 2018 foi realizada pela Associação Kaigai Nikkeijin Kyokai, a 59ª Convenção dos Nikkeis e Japoneses no Exterior. Normalmente esta convenção é realizada no outono em Tóquio, mas em comemoração aos 150 anos da imigração japonesa no Havaí, iniciada em 1868 quando os japoneses foram trabalhar em lavouras de cana-de-açúcar neste país, ela foi realizada em Honolulu em junho.

O tema da convenção era “Legado da sociedade nikkei”. Participaram 298 pessoas de 15 países e entre elas, 15 membros do “Projeto Kakehashi” do Brasil.

Com o patrocínio de um executivo japonês que tinha ligação com o Brasil, o extinto jornal São Paulo Shimbun selecionou 15 nikkeis ativos na comunidade, entre 20 e 40 anos, para participar da convenção em Honolulu e de uma viagem de treinamento ao Japão.

O líder do grupo foi Ricardo Nishimura, 41 anos, dentista e nikkei da terceira geração. No material de apresentação da 60ª Convenção dos Nikkeis e Japoneses no Exterior, ele escreveu:

“No painel de discussão, conversamos sobre o legado dos descendentes e da comunidade nikkei e então, pensei nos meus ancestrais que numa terra distante, com sacrifícios, vencendo muitos obstáculos, contribuíram para o desenvolvimento do nosso país. Nós, no Brasil de agora, estamos colhendo os frutos da luta dos nossos avós, que plantaram na nossa alma o orgulho de ser nikkei. Senti que temos a responsabilidade de transmitir este legado a longo prazo.

Os valores dos nikkeis havaianos estavam gravados numa pedra* e pensei em pesquisar os valores dos nikkeis do Brasil para fortalecer o orgulho dos descendentes e a vontade de preservar a cultura japonesa. Voltei para o Brasil com esta intenção e dei início ao “Projeto Geração”que passou a ser uma unidade executiva da Comissão do Projeto Kakehashi Japão-Brasil da Sociedade Brasileira de Cultura Japonesa e de Assistência Social (Bunkyo).

O objetivo deste projeto é reafirmar os principais valores, que fazem parte da personalidade de cada um dos nikkeis brasileiros, através da técnica de gestão do conhecimento. Os valores dos nikkeis brasileiros misturam a cultura do Japão e do Brasil e isto define nosso modo de agir e de nos relacionarmos, como indivíduos ou como membros da sociedade. Penso que seria ótimo se pudéssemos ir aprendendo a forma de contribuir para a sociedade brasileira, ao mesmo tempo que preservamos o laço com o país de nossos ancestrais.

(Extraído do material de apresentação da 60ª Convenção dos Nikkeis e Japoneses no Exterior)

Pilares de pedra existentes no Centro Cultural do Japão no Havaí.

Os valores dos nikkeis havaianos estavam gravados numa pedra. Foto por Brian Suda. Cortesia de Japanese Cultural Center of Hawai’i.

Esta entidade foi construída na cidade de Honolulu em homenagem aos 100 anos da imigração japonesa ao Havaí em 1989, sob a liderança da Câmara de Comércio e Indústria Japonesa local. Na entrada da exposição permanente estão enfileirados os pilares onde estão gravadas as palavras significativas dos japoneses da primeira geração: dedicação aos pais, gratidão às pessoas, paciência, esforço, resignação, gratidão à vida, lealdade, responsabilidade, vergonha, orgulho, honra, obrigação, sacrifício, etc.

Após a convenção, o grupo visitou o Centro Cultural do Japão no Havaí e impressionados com estes pilares, os membros tiveram a ideia de pesquisar os valores dos nikkeis brasileiros.

Os japoneses que imigraram para o Brasil são isseis, seus filhos, nisseis, seus netos, sanseis e ouvi que atualmente já nasceram os rokuseis (sexta geração). Como o índice de casamento com não nikkeis é alto (calcula-se que mais de 60% no caso da quarta geração), a classificação exata como descendente é difícil, mas estima-se que vivem no Brasil 1 milhão e 900 mil nikkeis (1% da população brasileira).

No começo os japoneses imigravam em grupos para o Brasil para trabalhar nas lavouras, assim havia muitas atividades comunitárias (escolas de japonês, iniciativas assistenciais e culturais), mas aos poucos os nikkeis foram deslocando-se para as cidades e, atualmente, 90% moram em grandes centros urbanos como São Paulo. A taxa de ingresso no ensino superior é muito alta entre os nikkeis (na famosa Universidade de São Paulo mais de 10% são nikkeis) que, como médicos, advogados, altos funcionários públicos, executivos mantém uma posição sólida na sociedade brasileira. Ao mesmo tempo, as principais atividades da comunidade nikkei foram declinando com os jovens focados nos estudos, com a evasão para as cidades e com o movimento decasségui. O número de entidades administradas por não descendentes tem aumentado também.

Diante desta situação, é compreensível que nikkeis trabalhadores ativos como o Sr. Nishimura tenham orgulho da posição conquistada, queiram resgatar dando um significado ao modo de viver dos pais e avós e tenham a intenção de transmiti-lo aos seus descendentes.

Os 8 valores escolhidos

Voltando ao Brasil, o Sr. Nishimura e alguns membros iniciaram a pesquisa dos valores. A atividade de pesquisa foi chamada de “Projeto Geração” que definiu como orientador o presidente da Sociedade Brasileira de Gestão do Conhecimento, André Saito. Graduado em Engenharia pela Universidade de Campinas, mestre em Administração de Empresas pela Fundação Getúlio Vargas e doutor pela Universidade de Ciência e Tecnologia Avançada de Hokuriku.

O projeto desenvolveu um workshop em 8 regiões com alta concentração de nikkeis, envolvendo cerca de 300 pessoas e definiu os 8 valores, sem ordem de importância:

  • 【Responsabilidade】 Respeitar as obrigações

  • 【Aprendizado】 Valorização do estudos e do aprimoramento

  • 【Integridade】Honestidade e sinceridade

  • 【Coletividade/Colaboração】Ações em conjunto

  • 【Perseverança】Paciência e coragem

  • 【Gentileza】Altruísmo e delicadeza

  • 【Gratidão】Reconhecimento das atitudes alheias

  • 【Respeito】Consideração aos antepassados e pessoas ao redor

Além destas palavras foram sugeridas outras como esforço, dedicação aos pais, comedimento, mas considerou-se que os valores que contribuíram para os nikkeis construírem a base sólida na sociedade brasileira foram as 8 escolhidas.

No Japão [Coletividade] (ações em conjunto) tem um aspecto negativo, quando a intenção de preservar a “harmonia” dentro do grupo acaba sufocando a opinião da minoria e, por vezes, há um estímulo a se ajustar às circunstâncias. Dias atrás, transmiti isso ao líder do projeto e ele respondeu que na sociedade brasileira existe a virtude de respeitar a diversidade, valorizando a individualidade, então, dentro dos limites, quer somar 1+1 e obter mais que 2.

Reforço que esses são os 8 valores dos descendentes brasileiros e não dos japoneses. Assim, escrevi este texto para que o povo do Japão soubesse que os nikkeis do Brasil querem carregar com orgulho os valores dos japoneses.

 

© 2021 Masayoshi Morimoto

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About the Author

Masayoshi Morimoto nasceu em Osaka, no Japão, em 1939 e se formou em Direito pela Universidade de Tóquio. Depois de trabalhar na Sony Corporation of America por 15 anos e na Sony Brasil por 10 anos, ele se tornou diretor-gerente da Corporação Sony, presidente da Corporação Aiwa, e presidente e CEO da Corporação Benesse, sucessivamente. Sua filha única, que tem cidadania americana, trabalha como advogada no Tribunal Federal de Recursos de São Francisco. Ele atualmente mora em Chiba, no Japão.

Atualizado em abril de 2021

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