Descubra Nikkei

https://www.discovernikkei.org/pt/journal/2022/7/28/vinicius-taguchi-2/

Vini Taguchi: Engenheiro Civil com Foco na Justiça Social - Part 2

O programa Kakehashi em Fukuoka

Ler Parte 1 >>

Juntando-se ao JACL

O programa Kakehashi foi a primeira experiência de Vini na qual todos os participantes eram americanos de origem asiática ou das ilhas do Pacífico. “Eu imediatamente me dei conta que me sentia mais em casa nesta comunidade, de uma forma que nunca tinha me sentido com os meus amigos japoneses, pois de repente eu estava num grupo diversificado de americanos com diferentes identidades raciais e um variado domínio do idioma japonês, onde a minha formação ainda era única, mas sem ser tão 'diferente' como de costume”.

“Depois da viagem com o Kakehashi”, Vini escreveu, “eu senti vontade de permanecer conectado com a minha recém-descoberta identidade nipo-americana, só que não estava ainda bem claro como eu poderia fazê-lo”. No começo, ele não teve a chance de estar presente em eventos para ex-participantes do Kakehashi e reuniões de grupos da JACL realizadas a 4 horas de carro do seu local de residência, mas continuou a participar das atividades do NC Japan Center. No entanto, “os participantes eram na maior parte imigrantes japoneses da primeira geração e indivíduos não japoneses interessados no idioma e cultura japonesa – não era a mesma coisa que a diáspora nikkei que eu havia descoberto”.

Vini e Micaela

Em 2016, Vini, acompanhado da sua namorada Micaela (agora sua esposa), se mudou para o estado de Minnesota para fazer pós-graduação. Com o incentivo de Micaela, ele se juntou ao grupo local Twin Cities da JACL (TCJACL). “Eu comecei participando dos seus eventos, depois fui convidado para as reuniões do conselho, depois fui enviado como voluntário para ajudar nos programas para jovens, e depois comecei a ter as minhas próprias ideias sobre como expandir os esforços já impressionantes do grupo local no que diz respeito à solidariedade e justiça social intercultural para todos, usando como referência o legado da experiência de aprisionamento sofrida pelos nipo-americanos durante a Segunda Guerra Mundial”.

“Eu gostei muito de trabalhar com a minha nova comunidade, mas em 2020 comecei a sentir que estava ficando muito pesado tentar viver duas vidas paralelas. Numa, eu era um estudante de engenharia civil tentando tornar as cidades auto-sustentáveis em um futuro climático incerto. Na outra, eu tinha me tornado um ativista asiático-americano pela justiça social. Eu estava ciente que, no fundo, esses dois mundos tinham como foco ajudar as pessoas. Mas eu ainda não tinha descoberto como equilibrar os dois.

Convenção Nacional da JACL em Salt Lake City em 2019


Ponto de Inflexão

Vini lembrou a data exata quando o seu trabalho com o TCJACL de repente se tornou mais urgente.

“Enquanto Micaela e eu curtíamos a nossa viagem de bicicleta e o piquenique 'à prova de COVID' que ela tinha planejado para a gente no meu aniversário, 25 de maio de 2020, eu não fazia ideia que do outro lado da cidade, na frente de carros de polícia com o lema 'Para proteger com coragem … Para servir com compaixão', um oficial do departamento de polícia da nossa cidade decidiu assassinar um outro local, George Floyd, enquanto três dos seus colegas o ajudavam. Se eu dissesse que nada nunca mais seria o mesmo, não seria exagero. Finalmente, o mundo inteiro havia assistido a um linchamento a sangue frio nos dias de hoje e em plena luz do dia, e não podia mais negar o que as comunidades 'de cor' sempre souberam: existe racismo sistêmico nos Estados Unidos e as consequências são letais.”

“No começo, eu não sabia o que fazer. Passei pelos mesmos estágios de choque, raiva e de sentir a necessidade de fazer algo, o qual acabaria gerando o movimento global de justiça racial sob a bandeira Black Lives Matter [Vidas Negras Importam]”.

O presidente da TCJACL, Amy Dickerson, encarregou Vini de compor uma declaração condenando o assassinato de George Floyd e de trabalhar com a sede nacional da JACL na elaboração do seu comunicado público. Junto com Micaela, Vini divulgou uma declaração dirigida ao chefe de polícia de Minneapolis, Medaria Arradondo, e ao prefeito Jacob Frey, exigindo justiça para George Floyd. “Eu nunca tinha feito nada como aquilo, e o comunicado estava longe de ser perfeito; ainda assim, foi um passo importante na nossa meta de alinhar publicamente a nossa organização numa posição antirracista, apoiando diretamente as comunidades negras”.

Mas ao invés de apenas adicionar mais uma voz ao coro de indignação pelo assassinato de George Floyd, o TCJACL desenvolveu um workshop que transformaria o sentimento de revolta em ação. Vini escreveu: “Amy sugeriu que elaborássemos um workshop que ajudaria os nossos membros a entender o que estava acontecendo e como poderíamos ajudar. Outro membro do TCJACL, Carolyn Nayematsu, me botou em contato com Roi Kawai, que havia participado de um dos nossos eventos virtuais recentes e que trabalha como Coordenador de Diversidade, Igualdade e Inclusão (DEI) no Minneapolis Public Schools [departamento governamental que supervisiona as escolas públicas de Minneapolis]. Roi e eu nos encontramos algumas vezes pelo Zoom e criamos um esboço para uma série de quatro workshops virtuais”.

Os workshops foram realizados entre julho e setembro de 2020. “Recebemos comentários extremamente positivos e tivemos de 36 a 50 participantes por workshop, representando 12 estados dos EUA, como também o Canadá. Esta série de workshops conseguiu incentivar um grupo de entusiasmados membros do TCJACL a trabalhar em tópicos relacionados à justiça social, especificamente no que refere à solidariedade com os negros, como também no desenvolvimento de parcerias com diversos indivíduos e grupos regionais e nacionais que se tornariam colaboradores inestimáveis”.

TCJACL em 2022

Vini resume as suas experiências em Minnesota desta forma:

“Vim para cá por causa da comunidade, mas acabei ficando por causa da justiça social. O TCJACL e, principalmente, alguns dos nossos membros mais antigos, como Sally Sudo e Janet Carlson, sempre estiveram focados na conexão entre a experiência nipo-americana e a experiência muçulmana americana. O TCJACL tem uma longa história de colaboração com o CAIR-MN (Conselho de Relações Islâmicas Americanas - Filial de Minnesota) em tópicos que incluem direitos dos imigrantes e a facilitação de diálogo desafiando a islamofobia e o racismo, os quais são arraigados na sociedade americana. As Cidades Gêmeas [Minneapolis/St. Paul] têm comunidades de refugiados muito grandes, incluindo consideráveis populações muçulmanas; por essa razão, não faltaram oportunidades de intercâmbio cultural. Para muitos no TCJACL, a retórica islamofóbica difundida após os ataques terroristas de 11 de setembro lembrou diretamente a histeria durante a Segunda Guerra Mundial que levou ao aprisionamento das suas famílias em campos de concentração nos Estados Unidos. Alguns políticos chegaram a sugerir, mesmo em anos mais recentes, que os americanos muçulmanos deveriam ser cadastrados ou até mesmo encarcerados em campos de concentração enquanto a ameaça aos EUA estivesse sendo avaliada. O TCJACL está firmemente comprometido em evitar que essa dolorosa história seja repetida”.

Engenharia Civil Voltada para a Justiça Social

Vini e Micaela retornaram recentemente à Carolina do Norte, onde compraram a sua primeira casa. Foi lá, como estudante universitário com colegas negros, hispânicos e indígenas americanos no programa de engenharia para minorias da Universidade Estadual da Carolina do Norte, que Vini havia traçado o rumo que tomaria a sua futura carreira como engenheiro civil. “Foi a minha exposição a uma diversidade de visões e experiências que acabou realmente dando ímpeto ao meu foco na justiça social”, Vini escreveu.

O prazer que Vini tinha na infância em brincar com água, como também o fato dele ter testemunhado uma inundação catastrófica durante uma visita à família em São Paulo, proporcionou um rumo para a sua carreira de escolha. Vini escreveu: “Acredito que esse desejo de melhorar a maneira que as cidades erguidas pelo homem interagem com o meio ambiente, especialmente frente à mudança do clima, foi um motivador vital no meu caminho rumo à engenharia civil e à gestão de águas pluviais”.

Engenheiros Sem Fronteiras em Guatemala, 2018

Vini queria ajudar as comunidades mais necessitadas, o que o levou a Engenheiros Sem Fronteiras - USA (ESF-USA), primeiro na Universidade Estadual da Carolina do Norte e mais tarde na Universidade de Minnesota, onde trabalhou em projetos realizados em países em desenvolvimento (Serra Leoa e Guatemala ) cujo propósito era a elaboração de fontes sustentáveis de água potável.

“O que eu mais gostei neste programa”, escreveu Vini, “foi que o processo do projeto tinha como foco a comunidade e o desenvolvimento de relacionamentos de longo prazo através dos quais solucionávamos problemas juntos, construíamos sistemas de água juntos, e nos dedicávamos a assegurar o conhecimento técnico e os materiais necessários para a sua operação contínua no futuro.” Foi um aprendizado prático do melhor.

Quando alguém pensa na função dos engenheiros civis, lutar pela justiça social não é o que geralmente vem à mente, apesar dos dois campos sempre terem sido indissociáveis. Os custos e benefícios de cada aspecto do ambiente construído, como também da localização de rodovias, serviços de utilidade pública e espaços verdes raramente têm sido distribuídos com igualdade. Vini explicou que “historicamente, a prática de redlining racial e outras formas de segregação e desinvestimento comunitário efetuadas por decisão do governo criaram deliberadamente áreas que eram 'agradáveis' de morar e outras áreas que 'não eram tão agradáveis'. As comunidades carentes viram depreciar o valor das suas propriedades e da sua qualidade de vida. Eventualmente, muitas dessas comunidades foram expostas a riscos ambientais resultantes de investimentos econômicos que colocaram indústrias indesejáveis em áreas de baixa renda”.

Corrigindo Erros

Leia a avaliação de Vini:

Limpeza de bairro na Carolina do Norte, 2022

“Ainda tem muito trabalho pela frente para corrigir os erros do passado, mas o movimento pela Justiça Ambiental, pelo menos em algumas áreas, já conseguiu limpar algumas das comunidades afetadas e melhorar a qualidade de vida dos moradores. No entanto, o que vem a seguir é a parte mais complicada. Quando as áreas 'subinvestidas' recebem um influxo repentino de investimentos focados no meio ambiente, elas se tornam atraentes para investimentos externos e passam por um rápido processo de gentrificação à medida que novos moradores com maiores recursos financeiros vão se mudando para lá. Os moradores originais geralmente têm dificuldade em resistir o seu deslocamento por diversos motivos: aumento dos aluguéis; aumento do custo de vida; aumento do valor das propriedades, o que incentiva a venda; hostilidade ou segregação social por parte dos moradores recém-chegados; e outras razões. A cruel ironia da 'gentrificação verde' (excesso de algo bom que acaba levando a algo ruim) começou a ser reconhecida por acadêmicos apenas nas últimas décadas, e pelo público em geral nos últimos anos; os ativistas focados em moradias a preços acessíveis são os que estão realmente na vanguarda desta questão.

“Para mim, a gentrificação verde se tornou uma preocupação diária porque, à medida que eu vou ajudando a desenvolver infraestrutura verde para ajudar as comunidades, preciso fazer todo o possível para garantir que os membros da comunidade que estou tentando ajudar vão estar por perto para aproveitar os benefícios do seu ambiente mais saudável. Fiz várias apresentações em conferências sobre o tema e escrevi alguns artigos sobre o assunto, mas ainda estou buscando oportunidades para fazer ainda mais”.

Se você deseja ler mais sobre o trabalho de Vini, clique aqui. Para ler mais sobre o TCJACL, clique aqui; ou você poderá encontrá-los nas redes sociais ao clicar aqui ou aqui.

© 2022 Esther Newman

Carolina do Norte Direito engenheiros civis Estados Unidos da América identidade igualdade justiça justiça social Liga dos Cidadãos Nipo-Americanos Minnesota Projeto Kakehashi Vinicius Taguchi
Sobre esta série

Esta série mensal apresenta entrevistas com jovens nikkeis do mundo todo, com 30 anos ou menos, que estão ajudando a moldar e construir o futuro das comunidades nikkeis ou fazendo um trabalho inovador e criativo, compartilhando e explorando a história, cultura e identidade nikkeis.

Design do logotipo: Alison Skilbred

Mais informações
About the Author

Esther Newman cresceu na Califórnia. Após a faculdade e uma carreira em marketing e produção de mídia para o Cleveland Metroparks Zoo, no estado de Ohio, ela retornou à universidade para estudar a história americana do século XX. Durante os estudos de pós-graduação, ela desenvolveu interesse pela história da sua família, o que a levou a pesquisar tópicos relacionados à diáspora japonesa, incluindo as migrações, assimilação e os campos de internamento americanos durante a Segunda Guerra Mundial. Ela está aposentada, mas continua interessada em escrever e apoiar as organizações ligadas a esses assuntos.

Atualizado em novembro de 2021

Explore more stories! Learn more about Nikkei around the world by searching our vast archive. Explore the Journal
Estamos procurando histórias como a sua! Envie o seu artigo, ensaio, narrativa, ou poema para que sejam adicionados ao nosso arquivo contendo histórias nikkeis de todo o mundo. Mais informações
Novo Design do Site Venha dar uma olhada nas novas e empolgantes mudanças no Descubra Nikkei. Veja o que há de novo e o que estará disponível em breve! Mais informações