Meu nome é Laura Hasegawa, tenho 77 anos de idade e lembro que os nikkeis da minha época ou possuíam apenas o prenome japonês ou tinham o primeiro nome latino seguido do nome de origem japonesa.
Minha mãe queria me dar o nome de Noêmia, porque o correspondente em japonês seria
Noemi「のえみ」, um nome muito prático para atender a duas finalidades.
Então eu nasci e logo meu pai foi ao cartório de registro civil e, quando voltou, falou para minha mãe: “Eu pus o nome de Laura”. A princípio, ela ficou surpresa, mas achou um nome muito bonito e passou a vida toda se referindo a mim não como Laura, mas sim “Raura”, segundo a pronúncia japonesa.
Quando eu estava no ensino fundamental, tivemos que escrever um texto explicando o porquê do nosso nome. E como eu era uma garota muito bem-informada sobre cinema, deixei a minha imaginação à solta e escrevi:
“Meu pai me colocou o nome de Laura porque assistiu ao filme de suspense norte-americano chamado `Laura`.”
Confesso que até hoje não sei exatamente se o que ajudou foi a minha imaginação ou se, realmente, o meu pai viu o referido filme de 1944.
Mas há uma outra versão contada pela minha mãe, de que havia uma enfermeira brasileira trabalhando na maternidade onde nasci e que foi ela que sugeriu o nome Laura ao meu pai.
Como falei anteriormente, muitas pessoas nikkeis da minha época possuíam apenas o nome japonês, de modo que uma senhora de origem alemã que morava na vizinhança achou que “Laura” seria japonês e perguntou à minha mãe o seu significado em português.
As crianças que não eram descendentes, principalmente as meninas, tinham um nome comprido demais, o que eu achava interessante e divertido. Por exemplo: Maria Elisabete Silveira do Amaral.
E mesmo os nikkeis, se tinham nome brasileiro além do japonês, esses nomes seriam mais longos que o meu, como por exemplo, Nelson Kazuhiro Kamimura, meu amigo de infância.
Agora vou contar por que não tenho nome japonês.
Voltando no tempo, foi no dia 23 de dezembro de 1919 que meus avós paternos chegaram no Brasil. Meu pai, Hasegawa Narumi, tinha três anos de idade. No Brasil seu nome seria Narumi (prenome) seguido de Hasegawa (sobrenome). Na carteira de identidade de estrangeiros, porém, ele foi registrado como Hasegawa Seikai. Explico: além de o tradutor ter lido o prenome japonês 「成海」como “Seikai” e não “Narumi”, que foi a leitura que meu avô queria, o sobrenome acabou ficando na frente como é a forma usual no Japão.
Como se não bastasse, “Hasegawa” termina em “a”, portanto, poderia ser confundido como nome de mulher.
Na certidão de casamento de meus pais e na minha certidão de nascimento o nome de meu pai está escrito de maneira correta: Narumi Hasegawa. O jeito então foi o meu pai solicitar ao Consulado Geral do Japão em São Paulo uma declaração atestando que Narumi Hasegawa e Hasegawa Seikai são a mesma pessoa. Sobre toda esta confusão, o meu pai preferiu se calar, não comentou nada até o fim da vida.
Por seu lado, a minha mãe nasceu no Brasil, mas tinha apenas o nome japonês: Mitsuno. Ela também enfrentou problemas por causa do nome, pois “Mitsuno” termina em “o”, o que aqui no Brasil seria um nome masculino.
Por causa de seus nomes, meu pai e minha mãe passaram a vida toda sofrendo as consequências. Na vida cotidiana, adotaram o uso de apelidos. Assim, os vizinhos os conheciam como “Seu João” e “Dona Luíza”.
Do mesmo modo como aconteceu com os meus pais, muitos japoneses e descendentes adotam apelidos para diferentes situações. A minha tia do lado paterno, por exemplo, chamava-se Chiyo e por causa da pronúncia “tio” sofria bullying na escola. Quando chegou à vida adulta e começou a trabalhar, ela adotou o apelido “Maria Helena” e até fez um cartão de visitas com esta identificação. Tive uma colega de trabalho chamada Toshiko e devido ao fato de algumas pessoas pronunciarem a palavra “tóxico” como “tóchico”, ela nunca disse seu nome verdadeiro para os alunos, ficando conhecida como “professora Teresa”.
“Nomes japoneses são difíceis de os brasileiros pronunciarem, além de causarem embaraço para quem os tem” – dizendo assim, meu pai nunca pensou em me dar um nome japonês e decidiu escolher um nome latino fácil de ler e de pronunciar.
Quando estive no Japão, as pessoas algumas vezes se dirigiram a mim como Urara san. Logo pensei que fosse uma falha na maneira de soletrar o meu nome, mas quando soube que existe no Japão o nome feminino 「うらら (Urara)」, isto me deixou muito feliz.
Em 1991, quando lancei o meu primeiro livro, pensei que seria uma ótima oportunidade para criar um nome literário e fiquei bastante animada. Não foi nada difícil, porque apenas acrescentei ao meu nome o sobrenome de minha mãe, ficando: Laura Honda-Hasegawa. O hífen que liga os dois sobrenomes é um elemento essencial, porque assim eu quero enfatizar que se trata de uma só pessoa – única, especial.
Graças à atividade literária, o meu nome que eu já gostava, ficou melhor ainda, o que me deixa feliz e realizada.
Eu me formei como bacharel em Teologia no dia 25 de outubro de 2024 pela Faculdade Teológica Sul Americana. Após concluir com esforço e sacrifício o curso que comecei no auge da pandemia, tanto os meus familiares como os pastores da igreja onde congrego e os meus amigos, todos estavam emocionados ao participarem da cerimônia de colação de grau.
Durante o evento, foi anunciado que um aluno (a) receberia a láurea acadêmica concedida pela direção e equipe de professores e foi quando eu ouvi anunciarem o meu nome: Laura Hasegawa.
Como foi algo totalmente inesperado, fiquei muito surpresa, ao mesmo tempo muito emocionada e feliz. Nos dias que se seguiram aconteceu algo que vou passar a contar.
Os meus amigos decidiram que iriam criar um nickname, um apelido que pudesse traduzir a minha pessoa depois dessa honraria.
Como “Laura” soa parecido com “láurea” surgiram sugestões como “Laura Laureada”, “Laureaura”, “Láurea Hasegawa”, “Laura Laurealina” (como Cora Coralina), “Laureada”.
Depois de 2 dias de votação, o nickname vencedor foi: Láurea Hasegawa.
E você, qual nickname escolheria?
© 2024 Laura Honda-Hasegawa
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