Quando Yugo estava com 4 anos de idade, os seus pais se separaram e Eneida, a sua mãe, foi embora de volta a Porto Seguro, sozinha.
Para o pai dele isto não foi surpresa, pois há muito pressentia que se separariam dessa maneira devido aos comentários que ouvia dos parentes desde o início:
“A Eneida veio para São Paulo atraída pelo estilo de vida que via nas novelas”.
“E o tolo do meu filho dizia que foi amor à primeira vista...”.
“Imagine, a Eneida nem cuida direito do bebezinho, mas bater perna na cidade ela sabe, né”.
Com a Eneida indo embora, a vida continuou como antes: de manhã, o pai trabalhava na feira e Yugo ficava aos cuidados da tia Harumi, a irmã mais velha de seu pai. Quando começou a cursar a escola fundamental, de manhã Yugo ia à escola e, à tarde, com o seu pai de volta do trabalho, os dois jogavam videogame e depois o pai repassava os deveres de casa do filho. Para Yugo, o pai era seu maior amigo, seu herói.
Quando estava concluindo a oitava série, quiseram arrumar uma nova esposa para o seu pai: ela tinha trabalhado como enfermeira no Brasil, mas estava se preparando para ser decasségui no Japão. Interessado o pai ficou, mas pensou: “Para o Yugo, é melhor ele terminar o ensino médio aqui no Brasil. E eu, sem o meu filho, não vou a lugar algum, não quero me separar dele nunca!”. Assim, a ideia de casamento não vingou.
Três anos se passaram rapidamente, Yugo terminou o colégio e, finalmente, ele e seu pai chegaram no Japão. Um ano antes, a tia Harumi junto com a família tinha se mudado para o Japão, indo morar na cidade de Yamato, na província de Kanagawa, e Yugo e o pai também foram para lá.
O pai arrumou emprego numa fábrica de peças eletrônicas e Yugo começou a fazer arubaito, serviços temporários, enquanto se preparava para ingressar na escola profissionalizante. Aos domingos, ambos frequentavam a escola noturna de nível secundário, pois o objetivo era de ter aulas em japonês.
Logo, Yugo fez muitas amizades, gostava de conversar com pessoas as mais diversas, fazendo felizes todos à sua volta. O pai observava todo orgulhoso o filho que tinha.
Certo dia, chegou uma carta da avó, avisando que alguém enviara um envelope endereçado a Yugo para a casa onde pai e filho viveram antes de partirem para o Japão.
Era uma carta de Eneida, a mãe que havia ido embora tantos anos atrás.
Filho amado,
Nestes 15 anos que me separam de você, eu tenho vivido cada dia da minha vida pensando em você e orando pela sua felicidade. Eu sei muito bem que fui a pior das mães, mas eu que quero que você saiba que estou me esforçando para mudar e tornar-me digna de ser chamada de “Mãe”.
Foi um tempo muito breve, mas relembrando, posso dizer que o tempo que vivi com você, seu pai, sua tia, todos, foram os anos mais felizes de minha vida.
Sabe, desde criança tive a saúde fraca, sempre indo ao médico, não podendo frequentar a escola direito, por isto, cresci sendo mimada pela família. Quando tinha 17 anos, fui a São Paulo ajudar na loja da minha tia, conheci o seu pai e logo tive você, meu filho.
E quando vi que você era tratado com tanto amor pelo seu pai, pela tia Harumi e a família dela, acabei pondo na cabeça que ninguém precisava de mim, eu tinha de saber onde era melhor eu viver. E para esfriar a cabeça e pensar bem, voltei para a casa da minha mãe.
Mas a minha mãe não aceitou o meu egoísmo e falta de consideração e quis me levar de volta a São Paulo. Foi aí que fiquei ruim, fui internada por causa de uma doença no coração e demorou muito para eu me recuperar. E mesmo com a saúde boa, cadê coragem para ir procurar vocês? Continuei em Porto Seguro levando a vida.
Recentemente, a minha tia de São Paulo pediu para eu vir ajudar na loja por ela já ser de idade e aqui estou novamente.
Filho, se você sentir no coração que quer se encontrar comigo, eu estou de braços abertos, quero muito te ver.
Mãe
Refeito da surpresa, Yugo ficou muito contente. As palavras de sua mãe calaram fundo na alma. Escreveu-lhe uma longa carta e enviou junto uma porção de fotos.
E prometeu a si mesmo que, um dia, ele iria até o Brasil buscar a sua mãe e, juntos, passeariam pelo Japão.
Até esse dia chegar, iria estudar firme, trabalhar bastante, conhecer mais sobre o Japão e ser uma espécie de ponte entre o Japão e o Brasil.
Ele estava decidido mesmo!
© 2022 Laura Honda-Hasegawa