Em casa, no Brasil, nós sempre usamos o português e na adolescência, freqüentei aulas de japonês porque meus pais queriam, mas sinceramente eu não dava tanta importância. Depois de interromper as aulas, também não usei mais a língua japonesa e esqueci muito do que aprendi. É claro que hoje, sou grata pelo esforço dos meus pais e por terem tido essa preocupação comigo. Tem coisas que só percebemos com o tempo e maturidade.
Sou nikkei de terceira geração e meus avós maternos nasceram e viveram parte de suas vidas na província de Fukuoka, por isso pude ser contemplada com uma bolsa de estudos para conhecer a cidade de origem de minha família. Antes de decidir ir para o Japão como estudante de intercâmbio, eu tinha alguns receios, já que estava no início de minha carreira. Depois de conversar com muitos amigos e pessoas mais experientes que eu, decidi ir para o Japão, pois percebi que esta oportunidade de aprender sobre o país e sobre a terra em que meus avós nasceram poderia não aparecer novamente.
Pouco tempo antes de viajar, eu estava preocupada, achando que seria incapaz de comunicar-me com os japoneses ou entender, por exemplo, o que seria dito em sala de aula. Quando cheguei no Japão, não conseguia responder a muitas perguntas e isso me deixava triste, mas ao mesmo tempo incentivava-me para aprender mais. Como a língua torna-se necessária para quase tudo o que você faz, tanto a leitura como a conversação, você se vê sem alternativas a não ser aprender e com o tempo e interesse, passa a assimilar naturalmente, sem perceber. Passados 6 meses no Japão, eu me questionava “Com 6 meses, parece que não evoluí nada, ainda não sei falar japonês”, mas na verdade, esquecia dos primeiros dias no Japão, quando precisava ouvir com muita atenção ao que me falavam e mesmo assim não entendia muitas das palavras. Quando eu pedia para a pessoa explicar de novo, eu continuava sem entender. Que desespero e decepção comigo! Mas agora, mesmo sem entender tudo o que me falam e sem saber falar tudo, não tenho mais essa sensação. Posso perguntar de novo o que não entendi, até que me expliquem com palavras que façam parte do meu vocabulário. Se conselho fosse bom, com certeza não seria dado e sim vendido, mas se você pensa em ir ao Japão, estude japonês, um pouco por dia, o quanto puder, que já será de grande ajuda.
As aulas de japonês que freqüentei ajudaram-me a aprender novas palavras, gramática e kanjis . Com um pouco mais de segurança em gramática básica, você passa a melhorar sua conversação também. Eu gostava muito de aprender línguas estrangeiras, como inglês e espanhol, além de estudar sobre minha pesquisa.
No começo das aulas, sentia-me frustrada porque havia muitos termos técnicos e difíceis usados na sala de aula. Procurava as palavras no dicionário, mas como são muitos kanjis e palavras novas, eu sempre esquecia. Em uma próxima aula, lá estava eu procurando a mesma palavra de novo. Eu ficava triste por ter memória tão ruim. Porém, comecei a entender que procurar várias vezes uma mesma palavra no dicionário, significava parte do estudo e ajudava na memorização. É preciso paciência, confesso que nem sempre eu tive esse dom em 100% do tempo. Saber que tantas repetições surtiram um efeito bom, alegravam-me.
Em junho, fui conhecer um grupo de estudantes que treina badminton , para que eu pudesse praticar meu japonês e conhecer mais sobre a vida dos estudantes japoneses. Eles foram bastante simpáticos comigo, no entanto, optei por não participar porque eram treinos intensos e eles participavam de campeonatos, utilizando-se das férias para viajar às competições. Fiquei bastante impressionada com o nível dos treinos e da habilidade deles. Esse tipo de atividade é bem comum entre os universitários japoneses. Há uma boa diversidade de grupos que se reúnem por terem algum interesse em comum, não só esportes, mas também hobbies .
O campus em que estudei era novo e mais edifícios iam sendo construídos rapidamente. Fiquei surpresa com a velocidade das construções e também feliz de estudar em um campus novo e moderno, que tinha até um ginásio bem equipado e uma academia.
Quando eu não estava nas aulas de Engenharia de Software, ficava no laboratório ou na biblioteca fazendo lições, estudando japonês e também os temas relacionados com a minha pesquisa sobre normas internacionais de qualidade de software. Estudei um pouco sobre a importância desse assunto para algumas empresas japonesas de tecnologia e o seu interesse no conceito de qualidade.
O tempo gasto no alojamento onde morei, também foi uma grande parte da minha experiência. Não significava só um local para moradia, mas também um lugar para conhecer pessoas de todo o mundo e criar memórias que durarão por toda a vida.
Meu ano no Japão como estudante de intercâmbio foi uma experiência surpreendente e sempre relembrarei com carinho as experiências e as pessoas que conheci. Foi muito bom morar em uma cidade tão amigável. Fukuoka é um lugar agradável para morar. Sentirei falta de sua culinária, seus pontos turísticos, as pessoas gentis. Depois de morar em Fukuoka, o modo de vida e a cultura dessa região tornaram-se especiais para mim. Acho que meus avós sentiam falta de Fukuoka quando vieram para o Brasil!
Minha mãe faleceu de câncer há um tempo. Ela esteve no país, gostou muito e desejava retornar um dia. Pensei que se eu fosse para o Japão de novo, ainda mais como estudante, ela ficaria muito feliz e orgulhosa, onde estivesse. Durante todas as experiências no Japão, acredito que ela esteve presente e compartilhou comigo os momentos de alegrias, de novas descobertas, de tristezas e de dúvidas.
Tive uma experiência de homestay inesquecível, pude conhecer o processo de plantação de arroz, ver as festas de fogos de artifício e vestir um quimono lindo. São exemplos de coisas que eu não teria oportunidade de fazer no Brasil.
Agradeço à Prefeitura de Fukuoka, à Fundação de Intercâmbio Internacional de Fukuoka, ao Fukuoka Kenjinkai do Brasil, à Universidade de Kyushu, aos meus professores, parentes e amigos, por todo o apoio que recebi. Obrigada a todos que me ajudaram nesse período da minha vida.
© 2010 Silvia Lumy Akioka