Em 1926, quando o Vancouver Asahi conquistou a vitória na Liga Terminal, Kenichi Doi era o arremessador do time. Mas inicialmente ele jogou no “Sun”, um time de beisebol nikkei da Mina de Carvão nº 5 de Cumberland, na ilha de Vancouver.
Eu pude conhecer a história de Kenichi em detalhes graças ao meu amigo Norm Ibuki, que me apresentou ao seu amigo George Doi, o filho mais velho de Kenichi.
Quando Kenichi estava no auge da carreira como jogador de beisebol, George era ainda criança e diz não se lembrar de ter visto a figura do pai jogando. A única coisa da qual se lembra é de ter ido ao estádio de beisebol na traseira da carroceria do caminhão e ter assistido ao jogo. Naquela época, era comum qualquer pessoa jogar beisebol e se divertir vendo a partida.
Para começar, George não sabia que seu pai jogava no Vancouver Asahi. Ele só soube disso mais tarde, quando o pai faleceu e seu tio Fred Tadao disse em conversa: “Quando o Vancouver Asahi veio a Cumberland, recrutaram o Kenichi, que era arremessador”.
Kenichi Doi nasceu em 1902 em Cumberland, na Ilha de Vancouver, e cresceu no Bairro Nikkei nº 5 nas cercanias da Mina de Carvão Nº 5 perto da divisa com a cidade de Cumberland. Filiou-se ao time de beisebol “Sun” do Bairro Nikkei nº 5, onde atuou como arremessador.
Um pouco afastado do Nº 5, havia o Bairro Nikkei Nº 1, com cerca de 40 famílias nikkeis e um time de beisebol chamado “Nippon”. Em 1922, o “Nippon” e o “Sun” formaram um time misto e foi onde Kenichi atuou e, em Cowichan-Comox Valley o time conseguiu vencer o campeonato local.
Em 1926, Kenichi foi recrutado pelo Vancouver Asahi e decidiu pela transferência. Na ocasião, o time garantiu-lhe alojamento e trabalho na serraria.
No mesmo ano, Kenichi levou o Vancouver Asahi à vitória. A Família Doi vinha da Província de Hiroshima, assim como um grande número de jogadores originários da mesma localidade atuou no time do Vancouver Asahi. Eram Tom Matoba, Mickey Sato, Jack Hayami, George Shishido, Ken Nakanishi, Jo Fukui, James Fukui, Kaye Kaminishi, de idades variadas e cada qual filiado a um time.
Kenichi, porém, atuou no Vancouver Asahi apenas no ano de 1926. Ao término da temporada, ele se casou e voltou a Cumberland.
Em 1927, um incêndio florestal acabou destruindo a maioria das casas do Bairro Nikkei, incluindo a de Kenichi. Ele e sua esposa, então, mudaram-se para Royston, distante 5 quilômetros e ele logo se filiou ao time de beisebol de Royston, que, além de atuar em toda a Ilha de Vancouver, jogava contra times menores do continente e também disputava no Estado de Washington, EUA.
O amigo Yoichi Nagata localizou o jornal local “Comox District Free Paper”, de 23 de maio de 1935, que informa a chegada a Vancouver do Giants de Tóquio nesse mesmo ano e a partida contra o time local Twilight League All Stars. A notícia diz ainda que, nessa ocasião, Kenichi Doi jogou não como arremessador, mas como segundo campista. O arremessador do Tokyo Giants foi Toshihide Hatafuku e depois Eiji sawamura. O famoso arremessador Victor Starffin não participou dessa partida.
Na coleção de fotografias do Museu de Cumberland encontra-se um grande número de fotos de times nikkeis em “Japanese Residents & Building”
George Doi falou também sobre o trabalho de seu pai.
Aos 12 anos, Kenichi trabalhava na Fazenda Kishimoto de gado leiteiro, localizada entre Cumberland e Royston. Todos os dias, levantava-se cedo, cuidava de 6 vacas e depois ia à escola. Frequentou a escola até o quarto ou quinto ano e depois foi trabalhar na mina de carvão. Mas como o salário era baixo e havia o perigo das explosões de gás, ele pretendia um trabalho em madeireira ou indústria de laticínios.
Certa vez, como ele havia machucado o pé durante o trabalho, um colega foi substituí-lo entrando na mina. Ocorre que nesse mesmo dia houve uma explosão. Kenichi não se recorda sobre o que aconteceu com esse colega que o substituiu, mas esse acidente causou a morte de alguns trabalhadores. Restou uma foto em que os jogadores do time de beisebol local estiveram no cemitério nikkei para prestar homenagem aos mineiros e colegas de time.
Com a mudança para Royston, Kenichi começou a trabalhar na maior serraria da região, uma empresa de capital nikkei. Mas parece que não gostou, porque depois de dois anos deixou esse trabalho e mudou para o setor de exploração madeireira, onde começou como assistente e depois foi promovido para chefe dos madeireiros. Naquela época, esse serviço era bem mais difícil que hoje e era executado em ambiente de trabalho muito severo, onde era preciso pensar na segurança em primeiro lugar e acumular muita experiência. E por um período curto trabalhou sob contrato na serraria dos cunhados.
Com o início da Segunda Guerra Mundial, a família de Kenichi foi forçada a ir para o campo de concentração de Bay Farm, em Slocan. Kenichi foi encarregado de ser o chefe de uma pequena serraria móvel instalada em uma antiga fazenda perto de Bay Farm. Depois, devido à falta de mão de obra, Kenichi obteve permissão para trabalhar fora da área restrita. E em 1944 e 1945, junto com mais alguns colegas, ele trabalhou nas serrarias de Rogers Pass e Chapman Creek, perto de Golden, na Colúmbia Britânica.
Kenichi faleceu em 17 de julho de 1981, em Slocan, Província de Colúmbia Britânica.
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Por fim, quero apresentar um fato feliz que aconteceu recentemente.
Para comemorar o centenário do Vancouver Asahi, em 2014 foi formado o Shin Vancouver Asahi. E em 2019 esse time fez uma turnê pelo Japão, da qual participou o bisneto de Kenichi Doi de nome Wylie Waters. Que conexão surpreendente! Uma matéria sobre o assunto está em: “The Shin Asahi Japan Tour: Wylie’s Story — Asahi Japan Tour 2019” por Wylie Waters (Nikkei Place Foundation, 6 de junho de 2019)
Estou profundamente comovido por saber que a história do Vancouver Asahi está sendo transmitida até os dias de hoje.
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O nosso Comitê Editorial selecionou este artigo como uma das suas histórias favoritas da série Mais do Que um Jogo: Esporte Nikkei. Segue comentário.
Comentário de Yusuke Tanaka
Ao ler “A história de família de Kenichi Doi, arremessador do Vancouver Asahi” de Yobun Shima, o passado de 30 anos de convivência com o “Asahi-gun” veio à tona em flashback. A pesquisa sobre a história desta família é preciosa. E a história do chamado “Asahi-gun” é o resultado de tudo que foi recolhido, de 1914 até 1941, como se uma rede tivesse sido lançada envolvendo todos. Talvez ninguém tivesse imaginado que, passados cerca de cem anos após a formação do time, o seu legado continuaria sendo transmitido.
Como membro do comitê editorial, devo ler as histórias concorrentes com objetividade, mas, fazendo um retrospecto de minha carreira, desde 1989 e durante 22 anos como editor do “Nikkei Voice”, somando mais 9 anos como free lancer, acho que não houve nem um dia nesse tempo todo em que não a palavra “Asahi-gun” não tivesse passado pela minha cabeça. Mesmo que a História Nikkei” seja dividida em diversas partes, alguma dessas divisões sempre terá conexão com a história do beisebol do Asahi.
No artigo de Yobun Shima há um trecho que diz: “Aos 12 anos, Kenichi trabalhava na Fazenda Kishimoto de gado leiteiro, localizada entre Cumberland e Royston. Todos os dias, levantava-se cedo, cuidava de 6 vacas e depois ia à escola”. Segundo Tokugi Suyama, nissei nascido em Cumberland e pesquisador da história local, o proprietário da fazenda, sr. Kishimoto, após a retirada forçada de sua propriedade, voltou a se estabelecer na Província de Ontário, onde novamente administrou a Fazenda Kishimoto. Quer dizer, mesmo perdendo os bens, as pessoas com habilidade para iniciar um novo negócio, tiveram forças para se reerguer rapidamente.
Os demais trabalhos relatam histórias magníficas de atletas de excepcional habilidade, porém, todas já foram publicadas em outros órgãos. Desta vez, gostaria de escolher o ensaio do sr. Yobun Shima, levando também em conta as características de minha carreira profissional.
* Yusuke Tanaka, membro do comitê editorial de língua japonesa, ao ler o artigo de Yobun Shima relembrou histórias sobre o “Asahi-gun” e decidiu escrevê-las >>
© 2020 Yobun Shima
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